sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

UMA LINDA HISTORIA, ELA ESPEROU SEU AMOR SAIR DA CADEIA...


Foto: arquivo pessoal
Não vou mentir. Viver com ex-presidiário é
complicado. A sociedade é preconceituosa.
Ninguém dava emprego a ele
Foto: arquivo pessoal


Estudei Direito para tirar meu amor da cadeia

Me apaixonei por um presidiário e, por ele, larguei meu marido e entrei na faculdade



Era domingo e fui com um grupo da igreja ao presídio de Piraquara, no Paraná. Eu tinha 26 anos, era dona de casa, mãe de dois filhos e cantava para evangelizar. Meu marido era pastor. No final do culto na cadeia, fui abordada por um dos presidiários. Seu nome era Luiz Roberto e ele ia publicar uma nota sobre nossa visita no folhetim interno da prisão. Dei meu endereço para que ele me enviasse um exemplar da publicação. Assim, começamos a trocar cartas.

Luiz tinha 29 anos quando o conheci. Estava preso havia dois anos. Depois de vários meses de correspondências, soube que sua primeira experiência no crime foi na adolescência, quando se envolveu com drogas. Aos 17, morou numa casa de prostituição e passou a liderar o tráfico local. Virou assaltante e foi condenado por roubo. Sua pena era de 27 anos de prisão.

Ele me contou tudo isso durante nossa intensa troca de cartas. O Luiz me escrevia todos os dias. E eu respondia quase com a mesma frequência.

Quando percebi, já estava apaixonada

Viramos confidentes. Mas conversávamos apenas como amigos. Só revelei que era casada depois de quase um ano. Foi um choque pra ele. Ficamos um tempo sem nos escrever. Senti falta. Apesar de ele ser um criminoso, eu enxergava no Luiz um homem capaz de se regenerar. Ele queria uma nova chance, estava arrependido. Decidi apoiá-lo. No fundo, eu estava apaixonada.

Não era mais feliz com meu marido. Me casei aos 16 anos e levava uma vida pacata: casa, igreja, esposo e filhos. Decidi me divorciar. Era mais sensato. Antes de falar com meu marido, fui ao presídio e contei sobre os meus planos ao Luiz. Ele ficou do meu lado e me deu força.

Foi uma época difícil. Minha mãe perguntava: ''Como você foi se envolver com um presidiário tendo um casamento perfeito?''. Meus irmãos romperam comigo. Minha vida deu uma reviravolta. Arrumei trabalho no comércio para sustentar minha casa e meus filhos. Depois consegui emprego melhor como funcionária pública.

Resolvi virar advogada

Enquanto isso, eu perguntava ao advogado do Luiz sobre a situação dele. Descobri que havia chances de o meu amor ter a pena reduzida. Dali em diante, comecei a me interessar pelo caso e decidi prestar vestibular para Direito.

Em 1985, iniciei o curso numa faculdade de Mogi das Cruzes, em São Paulo. Estava disposta a tirá-lo da prisão! Ou pelo menos conseguir benefícios que diminuíssem sua pena e o recompensassem pelo bom comportamento.

Um ano depois de conhecer o Luiz, passei a conciliar faculdade, casa, trabalho, filhos e visitas quinzenais ao presídio. Encarava 400 km de Mogi das Cruzes até o Paraná. E ainda levava roupas, produtos de higiene pessoal, comida e o que mais ele precisasse na cadeia. Custeava com a ajuda da mãe dele.

Lembro que as revistas para entrar na penitenciária eram constrangedoras. Tudo o que eu levava era vasculhado, como se eu estivesse escondendo alguma coisa. Passei por isso durante sete longos anos.

Nesse meio-tempo, terminei a faculdade, em 1989. No ano seguinte, tirei minha carteirinha da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Depois fiz dois anos de especialização na área familiar.

Estudei o caso dele para ajudá-lo

Como estudante de Direito, descobri que o caso do Luiz era complicado. Os empresários e políticos que ele assaltou no Paraná eram muito influentes e faziam de tudo para mantê-lo na prisão. Eu sabia que havia chances de diminuir a pena. Ele deveria pagar pelos seus crimes, mas de forma justa. Fiz estágio com o advogado do caso dele e batalhei para o Luiz ser transferido para uma penitenciária em São Paulo. Fui persistente, incomodava o juiz o tempo todo.

Assim, consegui que ele fosse removido para um presídio em São José dos Campos, no interior paulista. Depois que o Luiz cumpriu nove anos de prisão, obtive o benefício do regime semiaberto. A cada três dias trabalhados, diminuía um na pena.

Consegui também a diminuição de sua pena de 27 para 23 anos e seis meses. O fato de ele sempre ter tido um bom comportamento foi fundamental.

Nos casamos e tivemos um filho

Nos casamos em 1992, no civil. Ele já estava em regime semiaberto. Ficava preso de segunda a sexta e vinha para casa nos fins de semana. Meus filhos do primeiro casamento sempre se deram muito bem com o Luiz. Em 1994, tivemos nosso filho, o Junior. Foi a maior alegria de nossas vidas. Ele é o símbolo do nosso amor.

Não sou hipócrita. Viver com ex-presidiário é complicado, a sociedade é preconceituosa. Ninguém dava emprego ao Luiz. Afinal, além de ter passado pela cadeia, ele nunca havia trabalhado. E estava com 40 anos. Mas ele conseguiu uma colocação como vendedor autônomo numa empresa de produtos para emagrecer.

Em fevereiro de 2004, terminou de cumprir sua condicional, tornando-se um homem completamente livre e regenerado. Hoje o Luiz desenvolve um lindo trabalho voluntário com dependentes químicos em presídios. Sua missão é evangelizar, conversar com detentos, mostrar que há sempre uma nova chance na vida, basta querer. Ele sempre conta sua própria história como forma de incentivo.

Quanto a mim, continuo como advogada. Estou certa de que sou uma profissional melhor por viver tudo o que vivi ao lado do meu amor. Não foi fácil, mas faria tudo outra vez!

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