Os bastidores da separação, só profissional, de Fátima e Bonner
William Bonner chorou e a Globo resistiu à ideia, mas Fátima Bernardes bateu o pé: terá um programa matinal próprio
João Batista Júnior
Lailson Santos
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Patrícia passa a dividir a bancada com Bonner, no lugar de Fátima:
espectadores a consideram elegante e espontânea, mas ela terá de cortar o
cabelo
"Como chefe, eu não podia concordar. Como marido, não tinha alternativa
a não ser apoiá-la”, assim William Bonner descreve o momento em que
cedeu, pela primeira vez, à decisão da mulher, Fátima Bernardes, de
desmanchar a dupla mais conhecida do telejornalismo do Brasil. Foi no
dia 1º de janeiro deste ano que a firmeza de propósito de Fátima, que
cogitava fazer um programa próprio desde 2007, venceu a resistência de
Bonner. Depois de tocar o projeto em segredo, temendo até que as
felicitações pelo desempenho do Vasco, seu time, na verdade se
referissem ao futuro programa (veja a entrevista na pág. 136), Fátima
percebeu, em conjunto com a cúpula do Jornal Nacional, que não dava mais
para manter o sigilo. Sorridente, com os cabelos impecáveis — e
intocáveis, como se viu pela reação do público quando ela fez alisamento
japonês —, ela anunciou a mudança na manhã de quinta-feira, ao lado de
Bonner e de sua substituta, Patrícia Poeta, que troca o banquinho do
Fantástico pela responsabilidade maior ainda da bancada do Jornal
Nacional. Com o mesmo sorriso, mas atitude bem mais resguardada, Fátima
nem cogita entrar em detalhes sobre as especulações de que o casal
estaria se separando também na vida real ou de que os catorze meses de
idade a mais que o marido começariam a pesar. “Todos sabem que estou
radiante. Não existe luto”, diz.
Mudar para renovar é o nome do jogo de qualquer programa de televisão. O
Jornal Nacional está no ar desde 1969, e Fátima e Bonner o apresentaram
em conjunto durante treze anos e nove meses. Seguindo desejos
detectados por pesquisas de opinião, Fátima e Bonner nos últimos anos
imprimiram um ar cuidadosamente mais informal à apresentação das
notícias. Passaram a se olhar e conversar mais e a se dirigir aos
telespectadores de maneira mais pessoal. Um novo instrumento de
comunicação, o Twitter, aproximou Bonner de uma faixa etária mais
jovem. Até a cor das suas gravatas virou motivo de brincadeira em rede.
Além de administrar a rotina dos trigêmeos — com 14 anos, em pleno
início de adolescência —, Fátima começou a deslocar seu foco de
interesse. Queria fazer outro tipo de programa, menos noticioso e com
pitadas de entretenimento, ao estilo dos matutinos da televisão
americana. Em 2007, falou com a direção da Rede Globo, mas todos acharam
que era cedo para uma mudança. Dois anos depois, quando o jornal estava
para completar quarenta anos, sugeriu que sua saída fosse anunciada.
Ouviu do chefe Carlos Henrique Schroeder, hoje diretor-geral de
jornalismo e esporte: “É motivo de festa e você vai querer sair,
Fátima?”.
A virada aconteceu em abril, quando a sinopse de um programa escrita
por ela recebeu o sinal verde. A notícia foi dada a Fátima pelo diretor
da Central Globo de Jornalismo, Ali Kamel. Em outubro, uma equipe
comandada pelo diretor Guel Arraes passou a se encontrar uma vez por
semana para formatar a atração. Outros integrantes eram Claudio Manoel,
que fez a transposição da era Casseta & Planeta para uma posição
importante, à frente de programas de humor, e o jornalista Geneton
Moraes Neto, da Globo News. Reunidos na casa de um deles para manter o
projeto em sigilo, discutiam ideias e assistiam a programas ameri-canos
consagrados, como o Good Morning America, da rede ABC, uma atração
matutina dirigida ao público feminino — motor da maioria das decisões de
consumo. Outra inspiração para o grupo foi o extinto The Oprah Winfrey
Show, que ficou no ar durante 25 anos. Numa guinada longamente planejada
e copiosamente chorada, Oprah, de 57 anos, encerrou o programa em maio
passado e se transferiu para um canal próprio de televisão a cabo. O
programa matinal de Fátima, ainda sem nome, deve estrear em abril. Terá
uma hora e será diário. O horário da manhã é aquele em que a Globo
enfrenta competição mais acirrada. Entre 2006 e 2011, a audiência caiu
de 9,6 para 7,6 pontos. A da Record registrou aumento de 3,5 para 5,6
pontos. O programa mais afetado é o Mais Você, de Ana Maria Braga.
John Amis/AP
Inspiração
Depois de 25 anos de sucesso, Oprah Winfrey deixou seu programa para criar um canal de TV
Como Oprah Winfrey, Fátima confidenciou o desejo de “sair no auge”,
apesar da resistência do marido. Neste ano, Bonner renovou seu contrato
até 2018, e achava que Fátima deveria fazer o mesmo, argumentando, com
razão, que formam o “casal-símbolo”. Só acabou aquiescendo na conversa
mantida no primeiro dia do ano, pouco antes de uma viagem a Fernando de
Noronha. “Embora apreensiva, ela me disse que estava decidida”, conta
Bonner. “Pela primeira vez, cedi.” Ele chorou várias vezes enquanto era
editado, numa área coberta de papel branco para manter o sigilo, o vídeo
com os melhores momentos da carreira da mulher.
A escolha de Patrícia Poeta como a nova integrante do Jornal Nacional
foi cercada de cuidados. A Globo encomen-dou pesquisas para testar a
aceitação do nome de Patrícia, que é casada com Amauri Soares, diretor
de projetos e eventos especiais da emissora. Elas mostraram que Patrícia
desperta simpatia e confiança em todas as classes sociais com atributos
semelhantes aos de Fátima: é informal, elegante, independente e “ao
mesmo tempo mãe de família”. Meticulosa e aplicada, ela grava falas
várias vezes se detecta uma alteração na voz ou uma mecha de cabelo fora
do lugar. A exuberante cabeleira, porém, terá de perder alguns
centímetros para se adaptar ao padrão JN. Vestidos festivos não entrarão
mais no figurino profissional. O projeto de ter um segundo filho foi
adiado “por enquanto”, diz ela. Se as mudanças provocarem tantos
comentários como acontecia com Fátima, o interesse do público estará
garantido.
É com você, Fátima
Quando foi a decisão de deixar o JN?
Há quatro anos, mas a emissora achou que era cedo. Concordei e
participei de coberturas importantes, como a Copa da África e a eleição
de uma mulher para presidente. Em abril, a sinopse do programa foi
aprovada. Seis pessoas trabalham nela desde então.
Por que deixar o JN agora, ainda sem data de estreia do novo programa?
É impossível ser apresentadora e editora e, ao mesmo tempo, produzir
uma atração nova. Quando foi fechada a decisão sobre o nome de Patrícia,
há duas semanas, vi que estava na hora.
É difícil abdicar da bancada do telejornal mais importante do país?
Sei que estava na posição mais cobiçada do telejornalismo brasileiro.
Por muito tempo, tive até vergonha de assumir a vontade de ter um novo
programa.
Como reage às especulações de que está se separando de William Bonner?
Seria possível pensarem nisso se eu tivesse sido retirada do jornal.
Daí, poderia haver um luto. Mas todos sabem que estou radiante. Sinto
como se tivesse tido um quarto filho.
O fato de seu marido ser um ano mais jovem pode ter feito alguma diferença para o público?
Quando entrei no JN, fazia coberturas de temas mais leves. Por isso,
fiquei com a imagem de descontraída e ele, com a do chefe de jornal e
pai de família. Mas a percepção sobre ele mudou. Quando surgiu o
Twitter, ele canalizou ali seu espírito brincalhão. Os adolescentes
descobriram um novo William. No tempo que teria para tuitar, eu estou
ocupada em coisas como ver a agenda dos filhos para saber se preciso
comprar cartolina.
Está ansiosa?
Passei meses trabalhando em segredo, com medo de ser descoberta. Até
parabéns pela vitória do Vasco, meu time, me davam calafrios. Não contei
nem para os parentes. O público se sentiria tra